“Brincar é aprender” já se tornou um chavão da educação, em qualquer instituição educacional que se ouve de profissionais da educação, como professores e coordenadores, que a brincadeira incentiva o desenvolvimento da criança. “Brincar educa” é uma verdade educacional e como tal, se apóia em saberes para legitimar-se.
Na reportagem de Talita Bedinelli, Escolas de SP usam recreio para aplicar jogos e brincadeiras antigas, publicada na Folha Online, no dia 19/04/2010 reconhecemos alguns desse saberes que produzem a “verdade” de que a brincadeira pode sim educar. A reportagem explica como algumas escolas estão transformando o recreio em um momento de aprendizagem, por meio de brincadeiras antigas e jogos de tabuleiro.
No segundo parágrafo da reportagem já podemos identificar uma “verdade” posta, da qual a as escolas partem do princípio para a mudança; O texto afirma que “O objetivo (da mudança) é transformar o recreio em um momento de aprendizagem”, o que implica que sem a intervenção dos professores e desses jogos específicos, a criança não aprende nada durante o intervalo. O saber pedagógico está implícito nesta imagem na medida em que não se acredita que sem a pedagogia, sem a intervenção pedagógica, é possível aprender. Por outra perspectiva, olhando o quadro, temos ainda que o recreio, segundo a escola, deve ser um momento de aprendizagem. Essa visão porem é alertada por uma educadora (Marisa Elias) no terceiro parágrafo, que afirma que “o recreio é liberdade”, mas seguindo adiante na reportagem, reconhecemos outras justificativas para a legitimação da verdade.
Essas justificativas se baseiam em uma definição de aluno, de tipo de sujeito e em valores que são típicos da nossa sociedade e, por tanto, da educação. A partir dessa definição de sujeito e dos valores da educação a reportagem afirma a “verdade”, pois os pais e os profissionais da educação que lêem reconhecem suas concepções de filho e de aluno e seus próprios valores. Nesse ponto outro saberes além do pedagógico, entram em ação, como o psicológico, psicopedagógico e etc., sendo eles outra forma de legitimar a “verdade”. Os tipos de saberes se entrelaçam dando força, poder aos discursos de cada um.
O sujeito colocado no texto é definido por não saber brincar, ele é alienado, é inseguro, não sabe impor suas idéias e até um “mini-adulto”, que torna brincadeira atividades que fazem parte do cotidiano. Quando no sexto parágrafo a coordenadora do colégio Pentágono afirma que as crianças “têm dificuldade de iniciar uma brincadeira. Eles estão sempre à espera de alguém propor” ela afirma duas características sobre seus alunos: a primeira é que eles não são autônomos, eles dependem da escola, da professora para brincar; A segunda característica que ela coloca é que tudo o que os alunos fazem durante o recreio que não é proposto pela professora – porque sim, eles fazem “coisas” no intervalo sem a professora -, não é brincadeira, ou seja, eles não sabem brincar. Dessa forma ela caminha para outra verdade, a de que a única brincadeira real é aquela que educa. Ao final da reportagem temos a afirmação da professora da universidade (Maria Angela Carneiro), que coloca o saber psicológico indo de certa maneira contra à mudança no recreio da crianças; Ela afirma que se as professoras interferem em todos os momentos nas brincadeiras as crianças “podem virar adultos inseguros”, já que eles não têm autonomia em momento nenhum. Mas de maneira nenhuma essa frase deslegitima a “verdade”, de certa forma ela afirma ainda mais, já que faz uma ressalva para que as escolas não exagerem, mas façam sim.
Por último temos os valores que permeiam os saber pedagógico de maneira concisa, o que faz com que na reportagem eles tenham papel fundamental. É por meio deles também que outras escolas e os pais vão se identificar com a “verdade” e assumi-la como tal. Um dos valores mais importantes identificado no texto para convencer o leitor, que também é um sujeito definido – pessoas que têm idade superior a 30 anos– é o tradicionalismo. A repórter afirma que as brincadeiras mais procuradas são as mais antigas e mostra uma de uma mãe critica ao tempo gasto no computador. Essas afirmações se conectam com as verdades populares de que o antigo é melhor, vai de encontro com “no meu tempo... era muito melhor”, dessa forma o leitor toma para si a “verdade”, pois ele identifica seus próprios valores nela. Outro valor identificado é o da disciplina. A disciplina nunca pode estar fora do saber pedagógico e, no texto ela usa o saber social. No segundo parágrafo a coordenadora do colégio Santo Américo diz que ”Quando a criança aprende a brincar, ela aprende a respeitar regras, a saber esperar, a respeitar limites”; Esse são valores essenciais impostos pela sociedade, para fazer parte da sociedade é preciso aprender a respeitar regras.
Bibliografia
• SILVA, T. T. (2003) Dr. Nitzsche curriculista – com uma pequena ajuda do professor Deleuze. In: CORAZZA, S.; TADEU, T. Composições. Belo Horizonte: Autêntica, p. 33-57.
• BEDINELLI, Talita. Escolas de SP usam recreio para aplicar jogos e brincadeiras antigas. São Paulo; 2010. In: ww1.folha.uol.com.br/folha/educação/utl305u722777.shtml. Acessado em 20/04/2010
Trabalho realizado na disciplina Sociedade de Controle em Abril/10
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